2º Ano Ensino Médio - Noturno - Natureza e cultura

TEMA: O SER HUMANO: MONSTRO OU GÊNIO?


 “AINDA HÁ MUITO DE BABUÍNO EM NÓS? 

Em alguns sim, sem dúvida ... Passe apenas uma hora com eles e você perceberá rapidamente. Em outros, é menos evidente. Nesta área, os homens apresentam diferenças e desigualdades consideráveis. Da monstruosidade ao gênio há muitos graus. Onde estamos, onde você está entre esses dois extremos? Mais próximo da besta ou do cara excepcional? Difícil de responder. Tanto que as partes animais e humanas parecem difíceis de separar claramente. Onde está o chimpanzé? Cadê o homem? Às vezes, as duas figuras parecem conhecer um estranho entrelaçamento... [...] 

Descobrimos que o chimpanzé e o homem se distinguem na maneira de responder às necessidades naturais. O macaco permanece prisioneiro de sua bestialidade, enquanto o homem pode se livrar dela parcialmente, totalmente ou transformá-la, resistir a ela, superá-la dando a ela uma forma específica. Daí a cultura. Diante das necessidades, instintos e impulsos que dominam totalmente o animal e o determinam, o homem pode escolher exercitar sua vontade, sua liberdade, seu poder de decisão. Onde o chimpanzé sofre a lei de suas glândulas genitais, o homem pode combater a necessidade, reduzi-la e inventar sua liberdade. [...] 

O homem e o chimpanzé se separam radicalmente quando se trata de necessidades espirituais, as únicas que são próprias dos homens e às quais nenhum traço, mesmo que ínfimo, é encontrado nos animais. O macaco e o filósofo dificilmente se distinguem por suas necessidades e comportamentos naturais, embora estejam parcialmente separados quando o homem responde a essas necessidades através de dispositivos culturais; por outro lado, eles são radicalmente distintos pela existência, nos seres humanos, de um série de atividades especificamente intelectuais. O macaco ignora as necessidades espirituais: não há erotismo nas macacas, nem gastronomia em babuínos, filosofia em orangotangos, religião em gorilas, técnica em macacos ou arte em bonobos. 

A linguagem, não necessariamente a linguagem articulada, mas os meios de comunicar ou de corresponder, trocar posições intelectuais, opiniões, pontos de vista: esta é a definição autêntica de humanidade do homem. E com a linguagem, a possibilidade de apelar a valores morais, religiosos, políticos, estéticos, filosóficos. A distinção de Bem e Mal, de Justo e Injusto, de Terra e Céu, de Belo e Feio, de Bom e Mau, é feita apenas no cérebro humano, no corpo do homem, nunca na carcaça de um babuíno. A cultura nos afasta natureza, subtrai-nos das obrigações que submetem cegamente os animais, que não têm escolha.

A forma de responder às necessidades naturais e a existência específica de uma necessidade intelectual não são suficientes para distinguir o homem das cidades dos macacos da selva. Devemos adicionar, como um macaco especificamente humano, a capacidade de transmitir conhecimentos memorizados e evolutivos. A educação, a condição intelectual, a aprendizagem, a transmissão de conhecimentos e valores comuns contribuem para a criação de sociedades onde as disposições humanas são feitas e refeitas incessantemente. As sociedades de chimpanzés são fixas, não evolutivas. Sua habilidade é reduzida, simples e limitada. Quanto maior a aquisição intelectual no homem, mais ele recua em relação ao macaco. 

Quanto menos saber, conhecimento, cultura ou memória há em um indivíduo, mais lugar o anim al ocupa, mais ele domina, menos conhece a liberdade o homem. Satisfazer as necessidades naturais, obedecer apenas aos impulsos naturais, comportar-se como uma pessoa dominada por instintos, não sentir a força das necessidades espirituais, eis que o chimpanzé se manifesta em você. Cada um carrega consigo sua parte de macaco. A luta para fugir dessa herança primitiva é diária. É até o túmulo. A filosofia convida a lutar esse combate e oferece os meios para isso.” 

(ONFRAY, M., 2001, p. 30-34 [tradução livre])

ATIVIDADES

1 — Faça a distinção entre ação instintiva e ação inteligente. Dê exemplos. 
(ARANHA, M.L.A. & MARTINS, M.H.P., 2009, p. 53) 

2 — “É impossível sobrepor, no homem, uma primeira camada de comportamentos que chamaríamos de ‘naturais’ e um mundo cultural ou espiritual fabricado. No homem, tudo é natural e tudo é fabricado, corno se quiser, no sentido em que não há uma só palavra, uma só conduta que não deva algo ao ser simplesmente biológico — e que ao mesmo tempo não se furte à simplicidade da vida animal. 
” (Merleau-Ponty, M. Fenomenologia da percepção. São Paulo: Martins Fontes, 1999, p. 257) 

A partir da citação de Maurice Merleau-Ponty, explique o que significa dizer que para o ser humano, “tudo é natural e tudo é fabricado”. Dê exemplos. (Ibidem) 

3 — Faça uma dissertação relacionando o tema do capítulo e a citação do filósofo francês Blaise Pascal: “O homem não passa de um caniço, o mais fraco da natureza, mas é um caniço pensante”. 
(Pensamentos, aforismo 347. São Paulo: Abril Cultural, 1973. p. 127 [Coleção Os Pensadores]) (Ibidem)

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