2º Ano - Ensino Médio - Noturno - Filosofia - Ser e Agir.
Propaganda e ideologia
Eu, etiqueta. Em minha calça está grudado um nome que não é meu de batismo ou de cartório, um
nome estranho. Meu blusão traz lembrete de bebida que jamais pus na boca, nesta vida. Em minha
camiseta, a marca de cigarro que não fumo, até hoje não fumei. Minhas meias falam de produto que
nunca experimentei, mas são comunicados aos meus pés.
Meu isso, meu aquilo, desde a cabeça ao bico dos sapatos, são mensagens, letras falantes, gritos
visuais, ordens de uso, abuso, reincidência, costume, hábito, premência, indispensabilidade, e faz de
mim homem-anúncio itinerante, escravo da matéria anunciada.
Estou na moda. É doce estar na moda, ainda que a moda seja negar minha identidade, trocá-la por
mil, açambarcando todas as marcas registradas, todos os logotipos do mercado. Com que inocência
demito-me de ser eu que antes era e me sabia tão diverso de outros, tão mim mesmo, ser pensante,
que sente e é solidário com outros seres diversos e conscientes de sua humana, invencível condição.
(...) Já não me convém o título de homem, meu nome novo é coisa. Eu sou a coisa, coisamente. (Carlos
Drummond de Andrade, O corpo. Rio de Janeiro, Record, 1984, p. 85-87.)
A propaganda, seja ela comercial ou ideológica, está sempre ligada aos objetivos econômicos e aos
interesses da classe dominante. Essa ligação, no entanto, é ocultada por uma inversão: a propaganda
sempre mostra que quem sai ganhando com o consumo de tal ou qual produto ou ideia não é o dono da
empresa, nem os representantes do sistema, mas, sim, o consumidor. Assim, a propaganda é mais um
veículo da ideologia dominante.
Propaganda comercial é a que tem por objetivo vender um produto, um serviço ou uma marca ao consumidor. A partir de estudos sobre a sociedade norte-americana nos anos 50, descobriu-se que os consumidores raramente eram levados a comprar alguma coisa movida por apelos estritamente racionais. Esses
estudos levaram à pesquisa das motivações inconscientes e irracionais que mobilizam o consumidor.
Entre os fatores irracionais, vamos encontrar, necessidades e aspirações que dependem da imagem
que cada um tem de si e da imagem que quer manter perante os outros. A publicidade vai agir no
sentido de apresentar os produtos como meios eficazes para a satisfação dessas necessidades e
aspirações. Basta comprar o cigarro de marca tal, o relógio x, o jeans y, e as meias w para conseguir
sucesso profissional, segurança, charme, inteligência e o que mais se desejar. Assim, a publicidade
mascara a realidade e não nos deixa tomar contato com os meios concretos e possíveis de suprir nossas
necessidades: Ela transforma o objeto no fetiche que satisfaz.
O que a publicidade vende, portanto, é muito mais do que o produto: é a promessa de satisfação de uma
necessidade ou aspiração que extrapola, em muito, as possibilidades do produto. Recorrendo ao exemplo
de um anúncio de máquina de lavar louça, veremos bem o que ocorre. O anúncio, veiculado em revistas
femininas “classe A”, apresenta duas mulheres loiras de costas, com acentuado decote. Uma tem a pele
bem branca e a outra, a pele bronzeada e marcas de maiô. A chamada, em letras grandes, diz: “Você já sabe
qual das duas tem uma lava-louças x”. Ora, o máximo que o produto anunciado pode nos prometer é louça
bem lavada. A promessa, implícita na imagem, de tempo de lazer, local para tomar sol, aparência (segundo
a moda) bronzeada e saudável de “férias”, ultrapassa em muito o que o produto concretamente oferece. Os
apelos, portanto, são sempre emocionais. Mesmo quando se revestem de razões lógicas, o fundamento
da propaganda é despertar emoções de prazer, alegria, felicidade ou de frustração, privação e sofrimento,
emoções que dependem da posse de determinados produtos para serem usufruídas ou afastadas.
Assim, a propaganda acaba exercendo função modelizante: modela o comportamento por meio da
veiculação de valores que estão centrados no ter cada vez mais coisas. (N. J. Garcia, O que é propaganda ideológica, p. 10 – 11)
Propaganda ideológica A propaganda ideológica, isto é, a que vende ideias e não produtos, é feita de
modo muito mais sutil e, por isso, é muito mais perigosa. Raramente é identificada como propaganda.
“As mensagens apresentam uma versão da realidade a partir da qual se propõe a necessidade de manter
a sociedade nas condições em que se encontra ou transformá-la em sua estrutura econômica, regime
político ou sistema cultural.”
As informações aparecem como se a realidade fosse assim mesmo e houvesse absoluta neutralidade
na sua apresentação. Isso se dá tanto em obras de ficção como em noticiários, entrevistas e documentários. O que na maioria das vezes não percebemos é que há sempre uma seleção prévia de aspectos
da realidade que vão ser apresentados e uma interpretação dessa realidade a partir de um ponto de
vista que serve a determinados interesses. As informações, assim, são fragmentadas, retiradas do seu
contexto histórico e social.
Vejamos, por exemplo, como foi apresentada a greve dos professores de 1979. Mostraram-se escolas
fechadas, passeatas de professores, crianças soltas na rua, sem aula, mães sem saber com quem deixar os filhos para irem trabalhar. Foram apresentados todos os aspectos negativos, para a população,
da greve dos professores. Omitiram-se do noticiário, entretanto, dados fundamentais que os levaram à
greve: o cálculo do salário sobre 240 horas - aula mensais, sem considerar o trabalho, não -remunerado,
de preparação de aula e correção de exercícios e provas; o desgaste humano e afetivo de se lidar com
quarenta ou cinquenta crianças e jovens durante oito horas por dia; a política de desvalorização da educação, que recebe verbas cada vez menores; as condições de vida de um professor que, mesmo dando
oito horas -aula por dia, recebe um salário baixo: a questão das férias de três meses que, ocupadas, em
parte, com provas finais, conselhos de classe, preenchimento de diários, reuniões de planejamento e
trabalhos burocráticos, acabam reduzidas a trinta dias.
Tudo isso foi omitido,mostrando-se somente o prejuízo imediato das crianças sem aula e divulgando-se a figura do professor como “mercenário da educação”, que se nega a cumprir a “missão” de educar
as crianças para um Brasil melhor.
A propaganda ideológica elabora as ideias de forma a adaptá-las às condições de entendimento de
seus receptores, criando a impressão de que atendem a seus interesses. As técnicas usadas são a universalização dos interesses de um pequeno grupo; a transferência dos benefícios diretamente para os
receptores; a ocultação dos efeitos da exploração.
Assim, é preciso que estejamos sempre atentos. É evidente que não vamos negar todas as informações que nos chegam, seja sobre produtos e serviços, seja sobre o mundo em geral.
O importante é mantermos uma postura crítica, questionadora, comparando sempre as informações
entre si, observando o que ocorre à nossa volta, para podermos ter uma visão mais global dos fatos
e, principalmente, o conhecimento da origem das ideias veiculadas pelos meios de comunicação de
massa para descobrirmos a quem realmente elas servem.
Texto: ARANHA, M. L. de A.; MARTINS, M. H. P. Filosofando: introdução à filosofia. 3. ed. São Paulo: Moderna, 2003.
ATIVIDADES
1 – Os meios de comunicação podem contribuir para a resolução de problemas sociais, entre os quais o
da violência sexual infantil. Nesse sentido, a propaganda usa a metáfora do pesadelo para
a. Informar crianças vítimas de violência sexual sobre os perigos dessa prática, contribuindo para
erradicá-la.
b. Denunciar ocorrências de abuso sexual contra meninas, com o objetivo de colocar criminosos na
cadeia.
c. Dar a devida dimensão do que é abuso sexual para uma criança, enfatizando a importância da
denúncia.
d. Destacar que a violência sexual infantil predomina durante a noite, o que requer maior cuidado
dos responsáveis nesse período.
2 – Ao circularem socialmente, os textos realizam-se como práticas de linguagem, assumindo configurações específicas, formais e de conteúdo. Considerando o contexto em que circula o texto publicitário, seu objetivo básico é
a. Influenciar o comportamento do leitor por meio de apelos que visam à adesão ao consumo.
b. Definir regras de comportamento social pautadas no combate ao consumismo exagerado.
c. Defender a importância do conhecimento de informática pela população de baixo poder aquisitivo.
d. Facilitar o uso de equipamentos de informática pelas classes sociais economicamente desfavorecidas.
3 – Analise as afirmações e assinale a alternativa correta.
I. Um dos recursos da linguagem utilizados para persuadir o interlocutor é o modo verbal imperativo.
II. Slogan é a frase que resume a imagem que o publicitário deseja firmar no mercado sobre a identidade do produto.
III. III. Uma das figuras de linguagem mais utilizadas em propagandas é a metáfora.
a. Apenas a alternativa I.
b. Apenas as alternativas II e III
c. Nenhuma alternativa está correta.
d. Todas as alternativas estão corretas.
Aprofundamento Contextualizado
• ARANHA, Maria Lúcia de Arruda; MARTINS, Maria Helena, Pires. Filosofando – Introdução à Filosofia. Editora Moderna, 3ª Edição, 2003,.
• BUZZI, Arcângelo R. Filosofia para Principiantes – A existência Humana no Mundo. Editora Vozes,
11ª Edição.
CINE REFLEXÃO:
CLUBE DA LUTA. Dirigido por: : David Fincher. Suspense/ Drama. Fox Filme do Brasil, 1999.
Comentários
Postar um comentário