3º Ano Ensino Médio - Noturno - Ser e Dever.
A Filosofia Política Moderna e o conceito de Estado
Sílvio Gallo
O filósofo genebrino Jean-Jacques Rousseau pode ser visto como um opositor de Hobbes. Enquanto este concebia o estado natural como guerra e o estado social como fonte de segurança individual,
Rousseau afirmava o estado natural como fonte da liberdade e da igualdade, sendo essencialmente
bom, enquanto que a sociedade política era a fonte da guerra, posto que instaurava a desigualdade
entre os homens. Em seu famoso discurso sobre a origem e os fundamentos da desigualdade entre
os homens (1754/55), esse filósofo identifica o estado de natureza com a “idade do ouro”, quando os
homens eram todos livres e iguais entre si, vivendo em paz e harmonia. A origem da propriedade é
também a origem da desigualdade, pois as diferenças naturais não devem ser levadas em conta, mas
apenas aquela que instaura uma desigualdade de fato, que é a desigualdade social que aí se origina. A
origem da propriedade é também a origem da sociedade, pois “o verdadeiro fundador da sociedade civil
foi o primeiro que, tendo cercado um terreno, lembrou-se de dizer isto é meu e encontrou pessoas suficientemente simples para acreditá-lo.” 20 Com a propriedade, vem também o processo de acumulação
de bens e, se uns acumulam, isso implica em que outros deixam de acumular. A propriedade é fonte
das desigualdades, fonte da escravidão, da ganância e da violência e também é fonte da civilização. O
contrato social que institui o Estado é visto por Rousseau não como resultado da ação de todos os indivíduos, como viam Locke e Hobbes, mas como a ação dos indivíduos ricos coagindo aos mais pobres,
na tentativa de garantir para si as benesses da propriedade 21. Rousseau antecipa, assim, a visão do Estado como um instrumento de classe que seria enunciada por Marx no século seguinte, como veremos
mais adiante. Entretanto, o revolucionário filósofo não considera a instituição política como essencialmente má, defensora de interesses individuais; a sociedade não é contrária ao estado natural, como
queria Hobbes e, portanto, o Estado poderia ser organizado de forma a preservar os direitos naturais e a
igualdade entre os indivíduos — a que fatalmente chegaria Locke, não fosse sua defesa intransigente do
direito de propriedade. Encantado com a “idade de ouro” do estado natural, mas defensor da civilização,
Rousseau dedica-se a encontrar as formas de organizar os indivíduos socialmente de modo que sejam
preservados seus direitos e características naturais, de modo a que o homem não se corrompa como
nessa sociedade essencialmente má, na qual, apesar de “nascer livre, encontra-se sempre a ferros”.
Esse processo civilizador será examinado no Contrato Social. Para que possa ser garantia da igualdade, sem alienar a liberdade humana, o pacto social deve abranger a todos os indivíduos. Ninguém pode
ficar de fora pois, nesse caso, estabeleceria já uma desigualdade que corromperia a sociedade assim
instituída. Diferentemente de Hobbes, o conjunto dos indivíduos não abdica de sua liberdade em nome
de um único indivíduo, ao qual se submete, mas entrega a si mesmo ao controle de um indivíduo coletivo
que é formado pela união de todos os que pactuam ao firmar o contrato social. “Enfim, cada um dando-se a todos não se dá a ninguém e, não existindo um associado sobre o qual não se adquira o mesmo
direito que se lhe cede sobre si mesmo, ganha-se o equivalente a tudo que se perde, e maior força para
conservar o que se tem”. Se separar-se, pois, do pacto social aquilo que não pertence a sua essência,
ver-se-á que a celebração de tal pacto dá origem a um corpo social, o Estado, que nada mais é do que
a união de todos os indivíduos pactuantes num único indivíduo social; soberano aqui, não é o monarca
como em Hobbes, mas o próprio Estado enquanto união dos indivíduos. Isto é, o todo é soberano com
relação a cada uma das partes, todas elas iguais entre si. O filósofo prossegue: imediatamente, esse ato
de associação produz, em lugar da pessoa particular de cada contratante, um corpo moral e coletivo,
composto de tantos membros quanto são os votos da assembleia, e que, por esse mesmo ato, ganha
sua unidade, seu eu comum, sua vida e sua vontade. Essa pessoa pública, que se forma, desse modo,
pela união de todas as outras, tomava antigamente o nome de cidade e, hoje, o de república ou de corpo político, o qual é chamado por seus membros de Estado quando passivo, soberano quando ativo, e potência quando comparado a seus semelhantes.” Deste modo, não há, em Rousseau, abdicação da
liberdade para a instituição do Estado, posto que este nada mais é do que a reunião do conjunto dos
indivíduos e deve ser a expressão da vontade geral, isto é, a resultante das vontades individuais no que
diz respeito às questões comuns e coletivas. Como na perspectiva deste filósofo a soberania não é do
governo — os ocupantes da máquina administrativa — mas do povo enquanto conjunto dos indivíduos
pactuantes, não há nunca submissão individual, pois no Estado se realiza a igualdade política de cada
indivíduo, assim como sua liberdade se realiza ao obedecer a leis criadas por ele mesmo que não são
jamais leis de exceção impostas por outrem.
GALLO, Silvio. A Filosofia Política Moderna e o conceito de Estado
https://www.docsity.com/pt/filosofia-politica-de-silvio-gallo/5053025/. Acesso em: 28 de jun.2020.
1 — Câmara Legislativa do Distrito Federal — Consultor Legislativo — Redação Parlamentar — FCC (2018)
Para o filósofo francês Jean-Jacques Rousseau, o homem é bom, livre e feliz no estado de natureza. Os vícios e a corrupção resultam da vida em sociedade. É na sociedade que os homens
adquirem sentimento de inveja, cobiça e ódio entre seus semelhantes. Para que o homem viva
conforme sua natureza boa, livre e feliz, Rousseau defende:
a) A ruptura radical com os vícios da vida em sociedade e o retorno definitivo à vida em contato
com a natureza.
b) Uma educação em contato com a natureza para que na infância o homem não seja contaminado pelos vícios da sociedade.
c) Uma revolução que ponha fim às instituições criadas pelo homem em sociedade e a adoção de
um modo de vida anarquista.
d) A adequação aos bons costumes da vida em sociedade, pois é impossível o retorno definitivo
à natureza.
2 — Qual a diferença entre Rousseau e Hobbes na descrição do que é o estado?
3 — Defina a origem da desigualdade e a origem da propriedade de acordo com o texto.
4 — A definição de estado para Rousseau é aplicada em nossa sociedade? Explique:
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